Gazeta Mercantil . 06/06/2008
Um bancão, um violão e a bossa nova

Márcio Rodrigo

São Paulo, 6 de Junho de 2008 - O calçadão de Copacabana com suas linhas sinuosas se "mudará" para a Oca, no Ibirapuera, em São Paulo, a partir do próximo dia 7 de julho. Um dos maiores marcos arquitetônicos do Rio será instalado no subsolo do prédio projetado por Oscar Niemeyer como parte de uma exposição que o banco Itaú patrocinará. O evento tem como objetivo celebrar o meio século da bossa nova, ritmo brasileiro iniciado por João Gilberto que projetou a música brasileira para o resto do mundo. A mostra multimídia e uma série de shows fazem parte da primeira ação da Itaúbrasil,
plataforma de eventos que acaba de ser criada pelo Banco Itaú. A intenção principal é valorizar
as manifestações artísticas e culturais brasileiras. Sem conseguir esconder a satisfação pela
iniciativa, Antonio Matias, vice-presidente da instituição financeira evoca a histórica atuação de
Olavo Setúbal como apoiador do setor e todas as iniciativas culturais do Itaú para justificar a
decisão de financiar o novo projeto.

"Não é simplesmente uma iniciativa para se realizar mais eventos, mas sim um posicionamento do banco devido que leva em consideração dimensão social que tem a cultura no País", declarou o executivo. Questionado se a Itaúbrasil será financiada por investimentos diretos do banco ou com recursos subsidiados pelas Leis Federais de Incentivo à Cultura, mais uma vez Matias expressa satisfação: "Todo o financiamento para a plataforma vem da verba institucional do Itaú. Foram recursos reservados de nosso orçamento justamente para este objetivo", informa ele, que também fez questão de frisar que a iniciativa é para durar "anos" e não ser apenas usada para celebrar os 50 anos da Bossa Nova. Matias não quis revelar as cifras exatas que serão investidas neste primeiro ano do projeto. Valores divulgados pela própria assessoria de relações institucionais do Itaú dão conta de um
montante estimado em R$ 20 milhões. "Mas isto nem eu mesmo confirmo", se esquiva o executivo. "Gosto muito de meus concorrentes, mas não costumo revelar nossos investimentos neste tipo de ação para eles", brinca. No ano passado, o grupo destinou mais de R$ 183 milhões para projetos sociais e culturais, entre eles o Instituto Itaú Cultural que, de maneira permanente, realiza exposições, mostras, e trabalhos de formação como o Rumos, que apóia artistas de diversas áreas em busca de novas tendências artísticas.

Comemorações

Independente do valor a ser investido, o projeto da Itaúbrasil é disparado o mais importante e mais consistente realizado até o momento para comemorar os 50 anos da bossa nova no País. Sobre a batuta de Monique Gardenberg e sua tradição Dueto Produções – que criou o Free Jazz e até hoje realiza o evento com Tim Festival – a homenagem contará com, além da megaexposição em São Paulo, shows de Roberto Carlos e Caetano Veloso, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro e no Auditório Tim em São Paulo, em agosto, para homenagear Tom Jobim, e uma homenagem em 8 e 9 de julho a João Donato, também no Rio e em São Paulo, em que nomes como Bebel Gilberto, Fernanda Takai e Adriana Calcanhoto interpretam clássicos do compositor, considerado um dos expoentes da bossa nova.
Atrações A cereja do bolo, todavia, deverá ser as quatro apresentações que João Gilberto – oficialmente o criador da bossa com o lançamento do disco "Chega de Saudade", em 1958 – deverá fazer em São Paulo e no Rio pelo projeto. De temperamento difícil e recluso, o compositor não sobe aos
palcos há cinco anos. "Vamos ver se conseguimos o milagre de fazer João conversar com a imprensa", promete Monique, adiantando que está negociando com emissoras de televisão brasileiras para que exibam o show, atingindo assim o maior número de espectadores possíveis. "Os empresários dos artistas participantes também estão em contato para que as apresentações sejam transformadas em CDs e DVDs", afirma a produtora. Para assessorá-la no projeto, Monique convidou como curadores o consagrado produtor musical Nelson Motta, o crítico Zuza Homem de Mello, o antropólogo Hermano Vianna, entre outros nomes de envergadura ligados à cena musical brasileira. Por sua vez, os responsáveis pela exposição serão o designer e documentarista Marcello Dantas e videomaker e ensaísta Carlos Nader, que com um projeto futurista, devem transformar a Oca para que consigam transmitir

Patrocínio

todo o clima que tinha a zona sul carioca quando a bossa surgiu. "A idéia é que a exposição transcenda à questão musical", explica Nader. Uma linha do tempo Charge do dia histórica, com direito a vídeos e sons que são acionados pelo simples levantar dos braços dos visitantes da mostra deverá ser instalada usando cada uma das janelas arredondas do edifício. Da mesma maneira, os produtores prometem que usarão uma tecnologia denominada Eyetier, em que projeções de imagens "flutuam" no palco de maneira tridimensional, como se fosse uma apresentação ao vivo. "Nosso objetivo é fazer com que nomes consagrados da bossa voltem a ''tocar juntos''", explica empolgada Monique. Com uma homenagem deste tamanho, a produtora e o Itaú só não precisavam ter inventado uma explicação tão mirabolante para o fato de a exposição, o evento-âncora desta primeira edição da Itaúbrasil, ser na Oca, em São Paulo, e não no Rio, desde sempre o berço da bossa. É certo que o prédio de Niemeyer tem linhas leves e sinuosas, como a musicalidade bossista. Mas ninguém se importaria se eles dissessem que a cidade escolhida foi São Paulo, porque a sede do Itaú é aqui. Para os cariocas fica o consolo de saber que tanto Monique, quanto o Itaú, negociam para que a exposição siga depois de São Paulo, onde permanecerá por dois meses em cartaz, para outras cidades. Bairrismos e praias artificiais montadas em São Paulo à parte, a anedota que tomou conta do evento procede. A partir de agora, a história da bossa nova brasileira também é marcada pela máxima "um bancão e um violão", tamanha a homenagem do Itaú ao ritmo.